Nas dependências do Laboratório Zero, na Área Zero, a Grande Cratera da Região de Paldea, os pesquisadores Sada e Turo estão vivendo um momento sublime, insigne e inigualável. Eles acabam de concluir o projeto de sua vida: uma máquina do tempo. Ou melhor, do espaço-tempo. Um equipamento gigantesco capaz de te teletransportar para diferentes momentos na Terra.
Mas nada daquilo teria sido possível sem as incansáveis horas de trabalho duro e pesado. Sada sabe do inferno que é lidar com planilhas e mais planilhas de dados. Muitas noites sem dormir e cálculos para além do que o cérebro humano consegue processar. Com a ajuda de inteligências artificiais de reconhecimento de padrões e Pokémon benevolentes que se dispuseram a ajudar, a pesquisa durou 30 anos, mas poderia ter se prolongado muito mais se estes esforços não tivessem sido empregados na Física por trás da cronstrução da máquina do tempo.
Mas por alguma razão, Sada parecia insatisfeita. Seu filho Arven, de apenas um aninho, está deitado no carrinho, dormindo tranquilamente. Seu marido, que sempre esteve ao seu lado, apoiando-a em todos os momentos, mesmo nos mais difíceis, parecia estar mais feliz do que nunca. Ela tinha financiamento para sua pesquisa, verba esta que também garantia sua subxistência. E o silêncio daquele local ecoava nas paredes cristalinas, trazendo uma sensação de paz jamais vista em qualquer outro lugar. Mas então... O que estava faltando? Por que Sada não conseguia dar-se por satisfeita e aproveitar o grande Prêmio Nobel que estava prestes a receber por revolucionar a Ciência? Por que havia uma vozinha incomodando-a, no fundo de sua mente?No dia seguinte, uma aeronave desceu pela cratera, levantando poeira e quebrando o silêncio absoluto da Área Zero. Os Pokémon selvagens que por ali viviam saíram correndo, assustados. Mas a Professora Sada e o Professor Turo mantiveram-se firmes, olhando para a nave enquanto ela pousava. Na verdade, eles a estavam aguardando.
"Chegaram" disse Turo, sem conseguir evitar constatar o óbvio. É que dentro daquela nave encontravam-se os primeiros voluntários a viajar no tempo: os "Trovonautas", como se autointitulavam.
A Equipe, liderada por Friede, um jovem e aventureiro Professor Pokémon, começou a desembarcar um a um, seguindo o chefe e seu parceiro Pokémon, o Capitão Pikachu.
"Bom dia!" saudou Friede.
E assim, todos os membros da tripulação o fizeram, em respeito aos grandes nomes, Sada e Turo. Começando por Murdock, que vinha acompanhado de seu parceiro Rockruff. Um grande cozinheiro e também o chefe da aeronave.
Mas foi quando a última tripulante desceu da nave que o coração da Professora Sada pareceu encher-se de certeza. Liko, uma treinadora Pokémon de cabelo Índigo e vestes Ciano. Pouco se sabia sobre ela, afinal, fora adicionada às pressas por Friede na lista de voluntários e sua ficha cadastral não tinha muitas informações como a dos outros membros dos Trovonautas. Mas algo em seu olhar lembrava Sada de quem ela era no passado.
Havia algo em Liko que fazia Sada se lembrar de tudo o que a levou chegar aonde chegou. Esperança... Havia esperança.
"Sejam Bem-Vindos ao Projeto Terastal" começou o Professor Turo, cujo sorriso ia de uma orelha à outra. Ele não poderia estar mais contente com tudo o que estava acontecendo. Mal poderia esperar para coordenar a primeira viagem da humanidade ao futuro.
"Então este é o nome do projeto?" Perguntou Friede.
"Nada mais justo. Depois de descobrirmos o Fenômeno Terastal, que dá a Pokémon ordinários tipagens extraordinárias, descobrimos que os mesmos cristais responsáveis pela transformação também poderiam ser utilizados na construção de uma máquina do tempo."
"Será uma grande honra podermos participar do experimento" disse Friede, em nome de todos os membro dos Trovonautas, e estendeu a mão, a qual Turo envolveu com a sua própria, em cumprimento.
Naquela noite, a Área Zero estava lotada. Houve um banquete, preparado por Murdock. Turo mal consegue se recordar da última vez em que comeu tão bem. Mas além da comida, havia também a bebedeira, acompanhada pela birra e frustração de Roy por ser menor de idade e ainda não poder experimentar o vinho. O bebê Arven chorava no bercinho, com o barulho da música, que reverberava pelas paredes metálicas e cinzas do laboratório, em contraste às rochas cristalinas das cavernas que compunham a cratera, que brilhavam nas 7 principais cores do espectro da luz visível.
Sada não conseguia interagir com ninguém como deveria. Ela só conseguia fitar os olhos em Liko enquanto balançava o carrinho de Arven de um lado para o outro, na esperança de que ele pegasse no sono.
Mas ele não pegou.
Horas se passaram e Sada ainda estava cuidando do bebê, até que finalmente o diabinho apagou.
Nessas alturas do Campeonato, Murdock, Orla, Roy e Mollie já haviam ido dormir. Turo e Friede ainda estavam virando a última taça de vinho enquanto imaginavam o futuro da humanidade, entre soluços e gargalhadas. Se eles se levantassem agora, com certeza cairiam, de tão bêbados que estavam.
Duas da madrugada. O silêncio estava começando a retomar sua soberania sobre aquele local sagrado. Sada deitou Arven em seu bercinho e após um beijo na testa de boa noite, deixou o bebê com cheirinho de talco para, pé por pé, dar um jeito naquilo que a estava incomodando o dia inteiro. Ou melhor... A semana inteira, o mês inteiro, o ANO.
Sada adentrou nos dormitórios na parte interna dos laboratórios, sem que ninguém visse, e foi caminhando descalça para não fazer barulho, na pontinha dos dedos, até o quarto mais à direita.
Abriu a porta do dormitório feminino lentamente e dirigiu-se à cama onde Liko estava deitada. A garota estalou seus olhos azul-ciano na direção da Professora, que imediatamente colocou o dedo indicador sobre a boca, em um sinal de pedido de silêncio.
Liko calçou os sapatos e saiu do dormitório acompanhando a Professora.
O local estava tão quieto, que dava para ouvir o coração de Sada bombeando sangue disparadamente. Ela estava nervosa, mas precisava fazer isso.
"Liko..."
Ela começou, sem saber por onde começar.
"O que foi, Professora?"
Sada ficou em silêncio por alguns minutos. Ela estava prestes a desistir, mas reuniu todas as suas forças para dizer o que tinha de ser dito, para fazer o que tinha de ser feito.
"Estou incomodada" disse ela.
"O que? Comigo? Eu bem que notei que você ficou me encarando durante o jantar inteiro!"
"Não, não! Não é nada disso."
Sada sentiu-se envergonhada por um momento, de ter intimidado a garota.
"Esta pesquisa... Ela custou a minha vida. Foram trinta anos de estudos intensos. Agora eu estou com 45 anos, não tenho mais a energia que eu tinha antigamente."
"Quarenta e cinco? Sério? Não parece!"
Liko estava genuinamente surpresa com a idade da professora, mas ela não ligava para isso. A mãe natureza havia sido extremamente generosa com ela. Sua preocupação era com questões mais sérias...
"O problema é que... No fim das contas, é o meu marido quem vai levar os créditos por tudo o que eu construí."
"Hã?"
"Eu não vou negar. Eu só estou onde estou por causa da ajuda dele. Mas o Fenômeno Terastal... A viagem no tempo... Tudo isso fui EU quem descobri. E agora, com o Turo coordenando a viagem dos Trovonautas e Friede liderando a equipe que irá explorar um novo tempo, o que você acha que irá acontecer? Os nomes dos homens irão continuarão aparecendo à frente do nome de nós, mulheres. É um ciclo vicioso."
Liko encara a professora, séria. Ela não sabia o que dizer. Sara, uma mulher muito mais velha, estava se abrindo com ela, uma adolescente de 16, quase 17 anos.
"..."
"Veja, para um homem garantir o sucesso, ele precisa se provar apenas uma vez. Infelizmente, para nós, mulheres, precisamos nos provar O DOBRO. Por isso, eu estava aqui pensando..."
Sada então olha fixamente nos olhos de Liko e com o ímpeto de reivindicar o reconhecimento que era seu por direito, ela então propõe:
"Por que ao invés de deixarmos que os homens ganhem os créditos, porque não vamos lá e nos tornamos as primeiras a viajarem no tempo?"
Liko dá um sorriso. O mesmo sorriso esperançoso que Sada notara na garota assim que ela desceu da nave, pela manhã. Então, Liko responde certeiramente, sem nem precisar pensar muito:
"Por que não?"
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