Pensamentos Soltos: Liko #2


LIKO


Meu nome é Liko. Se você está à procura de uma pessoa normal, cai fora, pois eu estou longe disso!

Eu sinto como uma alienígena, para falar a verdade, sendo reintroduzida aos poucos nesta nova vida corpórea que eu havia abandonado há um bilhão de anos atrás, quando me tornei uma fantasma vagante. É estranho pra cacete, caso você esteja se perguntando... Eu não consigo fazer as coisas mais simples, como usar um lápis ou caneta para escrever. Depois de tanto tempo sem um corpo, tenho tido dificuldades em coordenar movimentos simples e complexos, como andar, falar ou manipular objetos. Logo que eu voltei, isso foi pior. Mas agora, estou me acostumando (à força, é claro!). 

Às vezes eu sinto que meu cérebro precisa de tempo para se ajustar ao ritmo normal do pensamento e da tomada de decisão. Sabe, como um espírito, tudo é incrivelmente fluido. Você se imagina em um lugar e BOOOM! Você está lá. Você pensa em virar a cabeça para olhar para trás, e você percebe que nem precisa fazer este esforço, você já está olhando. Mas agora, como humana, tudo é tão... Sólido. Eu preciso me lembrar de fazer o esforço de desviar de objetos que acidentalmente voem em minha direção, pois acredite ou não, não serei mais capaz de atravessá-los.

Quando eu estava vivendo livremente como um espírito, eu lembro de conviver com alguns Pokémon Fantasmas. Eram os únicos que podiam me ver e foram eles que me ensinaram a atravessar paredes. Eles iam e vinham conforme os anos. Eu nunca soube o que acontecia com eles... Por que eles desapareciam. Talvez os Pokémon de Tipo Fantasma também morram, mas eles já não deveriam estar mortos para começo de conversa? Talvez eles reencarnassem em algum outro local, não sei. Mas se a reencarnação existe, por que eu nunca reencarnei? Por que eu continuei aprisionada àquela rocha, sem poder me afastar muito de meu corpo de carne?

Sofrimento. Apenas sofrimento.

Dor, frio, calor, fome e sede agora são muito mais intensas para mim, e de certo modo, extremamente desconcertantes, já que eu não experimentei essas sensações por um período inimaginavelmente longo. Meu corpo, que já não era grande coisa antes de toda essa m3rd4 acontecer, está fraco, exigindo tempo e esforço para recuperar a força e a resistência. Então toda vez que eu caminho, me sinto pesada, cansada, como se uma força gravitacional extra me puxasse para baixo e me fizesse suar o dobro (ou até mesmo o triplo) que as demais pessoas para fazer uma simples tarefa como andar um quarteirão ou ir até a esquina.

Depois de um bilhão de anos sozinha, sinto uma espécie de solidão extrema e tenho enfrentado dificuldades em confiar nas pessoas ou me conectar emocionalmente com elas. Se você está acompanhando minha história, viu o que rolou entre mim e a Mollie. É... Estranho. Eu me sinto uma velha, uma anciã desajustada, presa em um corpo imaculado pelo tempo. Não estou reclamando da falta das linhas de expressão, mas da falta de ser levada a sério, da falta de autoridade.

Outro dia, enquanto ainda estávamos na Blueberry Academy, antes de rumarmos em direção à Área Zero, eu ouvi o médico dizer que "Lidar com memórias vastas e possivelmente confusas pode tornar difícil distinguir o que é real e imaginação" e que minha identidade pode estar fragmentada entre a pessoa que eu era e quem eu me tornei. Você não tem noção de como eu estou com medo agora. "Liko" e "Fragmentada" numa mesma frase, não dá certo. Você sabe... Eu assimilei Riko como uma parte de mim, mas este novo trauma, de ter vivido como uma fantasma por tanto tempo e de repente ser reinserida em um corpo humano, mortal, perecível... Isso pode ter mexido com a minha cabeça de alguma forma e está me dando calafrios, uma ansiedade que eu nunca experimentei antes. Temo o que isso possa trazer de consequências para mim e meus amigos, temo que isso possa me tornar uma pessoa ainda mais problemática do que eu sempre fui...

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